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"Vintage business": Concorrência ou competência?

Algumas considerações que tenho tecido, com base na experiência, sobre os pequenos grandes males do "vintage business":

A falta de cooperação, o individualismo

Não sendo esta uma característica exclusiva do vintage business, porque a reconheço generalizada no pequeno comércio em Portugal (basta ver como cooperativas e/ou associações rareiam/fracassaram pelo nosso pequeno país, ou como funcionam muitas vezes (mal), quando existem, "porque o meu produto é melhor que o teu, até podemos juntar mas nivelar é que não, nem em qualidade nem em preço"), está bastante presente no negócio do vintage. A especificidade deste ramo de negócio, com peças únicas e lojas/comércios/espaços também únicos, poderia fazer esperar uma atitude diferente. O facto é que uma maioria destes (geralmente pequenos) negócios não se revê num todo, num grupo com interesses comuns, nem acredita que, para prosperar e promover a sua forma de estar no mundo comercial, teria muitas mais vantagens se considerasse os outros comércios similares como aliados em vez de concorrentes. Assim mo dita a experiência. Salvam-se raras excepções locais: cito apenas dois casos, o do "Artes em Partes" ou, em anos mais recentes, a tentativa de reunir no C.C. de Cedofeita uma variedade de espaços com ofertas vintage _ tentativa que não tem surtido, a meu ver, resultados muito positivos, novamente pela falta de cooperação, por falta de objectivos e plano de acção comuns ou estratégias de publicidade comumente acordadas/apoiadas pelos lojistas, por se verem, alguns deles, como "inimigos" a abater. (Nota: um vintage department store que reunisse num mesmo espaço uma maioria de lojas/ofertas de roupa e acessórios, facilitando as visitas dos clientes/curiosos/compradores parece tarefa impossível, aqui no Porto; impensável não, porque cheguei a pensá-lo :) e, mais do que pensar, cheguei a sondar, a propor. Tentando perceber argumentos pro e contra. " Ai e depois se eu vendo mais, tu vais ver o que está a ter saída e mudas as tuas escolhas de venda, copias as minhas..." ou "se depois o espaço que me atribuem, localização, não é tão bom/boa como o teu/tua, ou a visibilidade/acesso são diferentes, ou vêm clientes para mim mas tu manipulas/atrais para ti... (a ilustrar esta forma de estar basta ver os pequenos exemplos nos mercados vintage em que se reclama porque outra pessoa tem melhor localização de banca, mais visível, mais central ou com mais 10 cm de espaço para ocupar).

Não somos (não sei se é mais do que nacional, mas nacional é com certeza, ressalva feita para o Alentejo de há tempos) de cooperar, de cooperativas, de associar, de associações, ou de partilhar e apoiar. Não chegamos/chegaremos assim a perceber o retorno do verbo (porque apoiar é apoiamo-nos) A competição

A. No espaço geográfico "Vai abrir outra loja vintage aqui na rua!"

Resposta produtiva/ win win: "óptimo, assim os clientes de vintage fazem uma mesma rota e reunem interesses e visitas!"

Respostas mais prováveis: "eh pá vão-nos roubar clientes! "agora toda a gente decidiu vender vintage!/macacos de imitação/invejosos"ou "vai lá ver o que vendem e os preços que estão a praticar, pf, anda, faz-me esse favor!" Como se o vintage não funcionasse à base de peças únicas e irrepetíveis.

Para os compradores seria óptimo poderem procurar os seus tesouros em espaços próximos uns dos outros e sairem satisfeitos de cada um desses espaços com coisas únicas compradas em cada um deles. O que falta aos comerciantes que assim respondem é confiança no projeto próprio, nas estratégias que são delineadas _ e acreditar que o que vendem tem público próprio e que a relação entre o que oferecem e o respectivo preço é justa _ caso contrário pouco deveria/deve incomodar-nos o que vendem os outros espaços e em que condições o fazem.

B. Na linguagem/no marketing

"Eu existo contra vocês e não com vocês" (ou, em linguagem corrente de redes sociais, somos os melhores _ os nossos clientes são os mais fixes, ou melhores, ou mais bonitos... as nossas peças as mais bonitas e de melhor qualidade...) Os melhores em quê, exactamente ??? Mas afinal não há vintage para todos os gostos, formas e feitios, dado serem peças únicas? Ou estaremos nós (vós, eles/elas/elxs) a falar de outras formas de negócio de segunda mão, dos tais outlets _ como gosto de dizer _ de peças em segunda mão de determinadas brands, mais luxury menos luxury, onde estão sempre a aparecer peças repetidas dado serem produzidas em série (mas com número de série, é diferente) e em anos relativamente recentes não sendo realmente o que entendo por mercado vintage. Mas então... "os nossos clientes são os melhores" ? ou "os mais bonitos/giros"??? Façam-me desenhos ... Então não são (quase) sempre os mesmos, ou não há pelo menos uma maioria composta pelo mesmo grupo de pessoas, que circulam entre lojas/negócios, comprando num e noutro espaço o que mais lhes agrada de cada um?

E/ou, mesmo que sejam clientes específicos de um dado ramo deste comércio (vintage de determinada época, ou luxury brands only, ou segunda mão actual, ou outra especificidade qualquer) não são comuns às várias lojas existentes para esse ramo específico???!

Não me parece que existam clientes vintage que comprem em apenas UMA só loja! Como é que, então, os meus clientes são os melhores, se são provavelmente os mesmos que os teus/dele/dela/delx...?Ou os meus artigos são os melhores, se não são comparáveis, porque são únicos???

Então, a minha "marca" é a melhor porque?... tem mais seguidores/likes que a tua? (seguidores/likes compram-se), tem mais lucro que a tua? (duvido que alguém neste ramo tenha hábitos de transparência quanto à facturação mensal).

A linguagem de marketing tanto pode enveredar por "temos peças espantosas" como pode preferir "as nossas peças são mais espantosas que as tuas, ou são as mais espantosas de todas!!!!"

A escolha de determinadas linguagens põe a nu princípios e objectivos, aproximando-se mais da paixão ou carinho pelo belo ou, pelo contrário, da competição, da procura de fama ou lucro, ou ambos.

Com assim, "somos os melhores"???... A reciclar? A vender? A cuidar do planeta? A bem receber os clientes? A ter ideias inovadoras que ninguém mais tem, mas que, vai-se a ver, muitos já tiveram antes de nós ou persistem em ter ao mesmo tempo que nós, só que somos demasiado cegos às qualidades dos outros para nos permitirmos ver isso? (só um crente acha que muitas das ideias que tem não foram tidas antes por alguém _ a mim aconteceu-me, só nestes últimos 6 meses, ver concretizados por outros, algures, sem que tenham trocado, alguma vez, qualquer ideia comigo, projetos ou ideias que eu própria pensei pôr em prática e achei geniais e quiça únicas, até ver outros porem me prática essas ideias! :) No caso da Mão Esquerda, sempre afirmámos as nossas especificidades, como objectivo de valorização da marca, mas não ocorreu pensar/dizer que os "meus kimonos são melhores que os teus" ou que os "meus vestidos japoneses são melhores que os teus vestidos europeus" (ou "que os meus, europeus..." :) :) :). .. porque também os vendemos, na Mão Esquerda) ou que os "meus artigos de luxo são originais" (subentendendo que os vossos podem ser fake!).

(Nota: ainda há pouco vi alguém, numa loja nas redes sociais, dando conselhos sobre como manter as carteiras de luxo impecáveis _ ora os conselhos eram exactamente os que se aplicam a qualquer carteira seja ela "branded or not"!. Porquê então estreitar o foco das sugestões quando bastaria dizer "como manter as carteiras (de luxo???) impecáveis, modo geral?)

Que me desculpe ou corrija com factos quem pensa/age diferente, mas continuo convicta que o maior investimento de negócio deve ser feito por valorização constante da nossa marca, mas internamente, em vez de contraposto ao que outros pensam ou fazem, em termos de negócio. E que isso se faz por optimização dos nossos processos e produtos, mas sem afirmarmos como "exclusivos" produtos e/ou estratégias que o não são, ou sem termos a veleidade de nos afirmarmos como os "melhores", preferindo antes a qualidade de "especiais", por não haver no vintage, dois corações de negócio iguais, salientando aquilo em que verdadeiramente somos únicos.


Esta história não tem de ter um final feliz. Mas salvaguardei o final para todos os negócios que, neste ramo, são honrosas excepções ao que acabo de comentar (e ainda são significativos) e que de cujo comportamento solidário tenho experiência própria, nuns casos, ou apenas conhecimento, noutros. Desde elogios abertos nas redes sociais, a sermos clientes uns dos outros, ou recebermos/darmos outras formas de apoio (recomendarmo-nos a clientes que perguntam por outras lojas por exemplo, a parcerias bem sucedidas), também tenho experimentado ou observado manifestações de companheirismo e apoio . Que se espalhem, breve e rápido, é o que desejo.

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